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Foto: Arquivo Pessoal |
Não é mais raro de se ver mulheres na cabine de um avião, nas salas de um aeroclube e etc. Parece mesmo que elas estão ganhando espaço e o machismo está sendo deixado de lado na aviação. A alguns anos atrás só víamos homens comandando essas incríveis máquinas, mas hoje, principalmente na GOL e Azul, já é possível ver a presença de mulheres no comando.
Conversamos com Jeisse Rocha, estudante de 25 anos e Presidente do Centro Acadêmico do curso de Ciências Aeronáuticas (CAER) da PUC-GO.
Quando
começou o seu amor pela aviação? Eu moro muito perto do
aeroporto e desde criança tive o privilégio de ver as aeronaves fazendo
aproximações finais para pouso bem perto de minha casa e este fato sempre me
proporcionou uma singela sensação de ter contato com a aviação, ainda que de
forma indireta. Lembro-me de acordar pelas manhãs aos sons do ‘ronco dos
motores’ das aeronaves. Eu amava, pois me imaginava fazendo aquilo, o que mais
tarde vim a saber que era um teste de motor, a aeronave acelerava e diminuía a
potência repetidas vezes. Aquilo era motivação para mim, quando as aeronaves de
porte maior aceleravam para efetuar decolagem, portas e janelas tremiam, quem
estivesse no telefone tinha de parar a conversa a fim de admirar a passagem de
um gigante do ar, há tempos atrás o ruído era ‘assustador’ para muitos e eu, é
claro, vibrava de alegria com aquilo tudo (risos). Passei o meu ensino médio
inteiro estudando e fazendo cursinho só para ter o privilégio de um dia cursar
uma universidade de aviação, sempre pesquisava as universidades, escolas de
formação de pilotos e aeroclubes aqui de minha cidade, também outras pelo
Brasil, desta pesquisa comecei a conhecer muitas pessoas do meio, inclusive pilotos,
acompanhava alguns deles pelas redes sociais e sempre buscava fazer o possível
para ser como eles.
Você
estuda, faz algum curso em prol de realizar o seu objetivo na aviação? Sim,
atualmente eu curso Ciências Aeronáuticas na Pontifícia Universidade Católica
de Goiás PUC-GO e estou indo para o 7º período.
Como é
o curso e qual a significância que ele tem em sua vida? O Curso
de Ciências Aeronáuticas (CAER) aqui da PUC-GO é um curso de bacharelado com a
duração de 3 anos e 6 meses cujo objetivo principal é formar pilotos de linha
aérea. Porém, desde 2017/01 sua grade foi alterada e o curso passou a ter 8
períodos, 4 anos no total possibilitando uma formação dupla: Ciências
Aeronáuticas/Piloto de Linha Aérea (colação de grau atribuída somente aos que possuem todas as
licenças de voo) e Gestão em Aviação Civil (colação de grau atribuída a todos
que concluíram o curso, independente de suas horas de voo) Esta possibilidade
de formação dupla me motivou de tal forma que, como graduanda, decido
permanecer mais alguns meses na universidade a fim de obter este diploma, uma
vez que ainda não tenho nenhuma hora de voo e com a Gestão em meu currículo
creio que terei mais chances de conseguir um emprego e assim então, pagar
minhas horas de voo. Certamente estarei com uma melhor qualificação, já que
venho crescendo como aluna e pessoa através das oportunidades que venho tendo durante
minha jornada de estudos. Sou grata a Deus por tudo o que vivi na PUC, ela foi
e continua sendo uma grande escola.
Conte-nos
um pouco mais como foi sua trajetória de estudante na PUC-GO. Eu demorei
cinco anos para começar o curso de Ciências Aeronáuticas, neste período estive
estudando coisas indiretamente relacionadas com a aviação, depois fiz dois
cursos de idiomas, mas a faculdade mesmo só foi possível de ser realizada em
Agosto de 2014. Assim que passei no vestibular, fui orientada a fazer alguns
exames a fim de tirar o CMA (Certificado Médico Aeronáutico), um procedimento
compulsório a todos os profissionais dispostos a serem pilotos, cuja finalidade
é de averiguar se o candidato está apto ou não para realizar voos. Após dois
dias realizando os exames fui aprovada, tendo assim minha primeira conquista.
Em meu primeiro dia de aula, sentei na fileira da frente, no canto da janela
(talvez assim pudesse ver algum avião), era tudo novidade para mim, a sala era
espaçosa e organizada, os professores falavam de seus voos e nos faziam dar
boas risadas, além de nos ensinar muito sobre as disciplinas. O legal é que eu
já conhecia muitos veteranos devido ao fato de seguir muitos pelas redes
sociais e por sempre me manter atualizada sobre os eventos que ocorriam na
universidade. Foi então que algo inesperado aconteceu: eu recebi uma mensagem,
estando ainda no 1º período de uma amiga veterana que trabalhava em um dos
laboratórios da PUC, me lembro até hoje da mensagem que dizia: “(...) eu
trabalho aqui no laboratório do CAER onde fazemos a montagem e manutenção na
oficina do simulador de voo do A320 e temos uma vaga para alguém do 1º período
e pensei que a pessoa ideal para esta vaga é você (...)” Eu não estava acreditando
no que os meus olhos liam! Fiquei lisonjeada, aceitei, é claro! Ainda não
sabia, mas foi só o começo de minha história em ser moldada ao ‘caráter’ da
aviação, lá eu aprenderia a montar uma avião para simulação de voo, seu
funcionamento bem como em participar dos voos nas feiras e eventos que o CAER
participava.
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Foto: Acervo Pessoal |
Inicialmente, o que parecia apenas um convite
simples de minha colega veterana, se tornou para mim motivo de muita alegria,
questão que é motivo de minha gratidão até os dias de hoje, que sempre faço
menção em cada agradecimento de fim de semestre.
Você
disse que foi moldada ao ‘caráter’ da aviação. O que quis dizer com isso?
Existe algo específico que os pilotos tem de diferente das outras profissões? Quando
eu falo ‘caráter me refiro diretamente ao perfil que o profissional aviador
deve desenvolver durante os seus estudos, por exemplo, ser proativo, que é
justamente prever as necessidades que determinada situação demanda sem ser
necessariamente solicitado para fazer, é ter atitude, é agir frente a algo que
requer sua atenção. O fator timidez e a auto-estima baixa me limitavam demais,
trabalhar na oficina de montagem do simulador foi a motivação que eu estava
precisando. Porém, não é que o piloto tem especificidades além das demais
profissões mas que ele faz uso de todos os recursos que possam reforçar o seu
poder de decidir e agir em prol de algo. Se formos reparar bem, existem
convenções que a aviação adotou da marinha e assim por diante, as profissões se
complementam e os profissionais também, estamos em constante estado e aprender
uns com os outros. Aquilo que traz bom resultado deve ser sempre copiado, é a
típica “invejinha branca” (risos).
Você
trabalha em algum outro projeto além da oficina de montagem do simulador de voo
do Airbus A320? Sim, atualmente sou a presidente do Centro
Acadêmico Santos Dumont (CASD) do CAER. Mas comecei como vice-secretária na
gestão 2015/02 a 2016/01. Aprendi muito, acompanhei os projetos, fiz sugestões
e contribuí com a equipe. Fui monitora de Teoria de Voo 3 vezes, duas vezes
para Piloto Privado e uma vez para Piloto Comercial e também atuei como
professora particular de inglês da aviação para os meus amigos de classe.
Como
tem sido o seu trabalho como presidente? De que forma você lida com os seus
colegas em um meio cuja maioria é composta por homens?
Bom, como presidente do CASD eu procuro dizer
que sou aluna como os alunos, a única diferença é que eu apanho mais (risos). Já
comecei a gestão sabendo que a presidência é um cargo de exposição, mas, uma
vez que eu aceitei o desafio era isso e pronto, não tinha mais volta, o jeito era
marchar e fazer dar certo. Acredito que o primordial não me faltou: Deus. Minha
família e alguns poucos mas bons amigos foram motivos de força para que eu
pudesse permanecer nesta difícil porém linda missão. Eu sabia o que estava por
vir, já tinha acompanhado a gestão anterior, meu antecessor passou por muitos
momentos difíceis: reuniões, projetos, ofícios, dormir tarde, acordar cedo,
etc, certamente não era o que eu queria, até mesmo porque minha vida de
vice-secretária estava boa demais, eu não queria mudar aquilo. Lembro-me de uma
ocasião em que consegui convidar uma comandante internacional para falar um
pouco mais como é a profissional de uma aeronauta em nosso Simpósio de Ciências
Aeronáutica, que ocorre todo ano em Outubro como forma de comemorar o dia do
Aviador. Foi uma experiência muito rica, eu fiz a parte boa, levei para
almoçar, busquei e levei ao aeroporto juntamente com o vice e só. Nada de
assinar contratos, nada de pagar a conta, nada de dor de cabeça, tudo na mais
perfeita paz, já como presidente a conversa foi outra (risos). Mas acredito que
fui bem, pelo menos foi o que muitos me disseram. Consegui convidar 3 pilotos
mulheres para o Simpósio em que eu estava de fato organizando. Cada uma abordou
um tema importante ao público que foi composto por alunos, egressos e público
em geral, teve uma mesa redonda, homenagens e alguns brindes aos participantes
e palestrantes, bem como uma singela homenagem a eles no final do evento.
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Foto: Acervo pessoal |
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Foto: Acervo pessoal |
Outra questão que me emocionou muito e me
deixou feliz durante à presidência foi uma homenagem que recebi no Plenário da
Câmara Municipal de Goiânia, um Diploma de Honra ao Mérito devido ao Movimento
Estudantil, pela luta e defesa dos direitos dos estudantes. Hoje, como
representante de todos os alunos do curso de Ciências Aeronáuticas eu posso dizer
que esta homenagem não é mérito somente meu, mas de todos aqueles que de alguma
forma me motivaram a chegar até aqui, que acreditaram em mim quando nem eu
mesma o fiz, sendo minha família o agente de principal importância. Muitos não
me referiam como uma aluna modelo devido as “estranhas conversações” de querer
ser piloto, “isso não é coisa de gente normal”, etc e etc. Acaba que eles
tinham razão, a aviação não é mesmo coisa para “gente normal”, mas somente para
os escolhidos e para aqueles que realmente sentem amor por voar, pois estes
sim, são os que voam.
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Foto: Acervo pessoal |
Sobre lidar com a quantidade de meninos no curso, eu não vejo
dificuldade, uma coisa que acho linda no curso é que nos tornamos uma grande
família e eles são meus irmãos. O índice de meninas que ingressam no curso está
aumentando também, na minha época éramos um total de sete, sem contar com a
quantidade de meninas em outros períodos, havia um número considerável delas.
Com relação aos calouros, há um apreço especial, é como se fossem meus
filhinhos, tenho todo o cuidado do mundo. Costumo deixar uma vasilha de vidro
com balinhas na sala do Centro Acadêmico, assim todos que visitam recebem um
brinde como forma de demonstrar o zelo que tenho pela vida de cada um, procuro
sempre tratá-los com respeito e atenção.
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Foto: Acervo pessoal |
Como
você se sente frente a todas estas conquistas até agora? Me
sinto cuidado por Deus. Apesar dos erros e defeitos que possuo, sinto que Ele
permanece proporcionando novas chances de aprender e passar o conhecimento que
venho conquistando em cada período. Minha mãe e eu sempre conversamos a
respeito da aviação e ela até sabe o nome de alguns aviões (risos). O meu pai e
meus irmãos tiveram uma participação muito especial em tudo o que fiz até aqui.
Minha irmã primogênita, por exemplo, estuda Administração, mas era ela quem
ficava em minha sala do Centro Acadêmico, conversando e atendendo os alunos
enquanto eu não estava. Foi minha família que me ajudou a organizar o Simpósio
e tudo o mais que precisei durante os meus trabalhos como presidente, sou
imensamente grata. Fui muito bem atendida pelo Comandante Raul Francé Monteiro,
Coordenador do curso de Ciências Aeronáuticas aqui da PUC-GO e que ao longo de
minha gestão, foi se tornando um amigo, quem me passou grande bagagem de
conhecimento que irei levar para à vida.
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Foto: Acervo Pessoal |
Para
encerrar nossa entrevista, o que você tem a dizer para todos os leitores, pessoas
da aviação e demais profissionais? Se existe dentro de você
alguma força capaz de te motivar a fazer algum curso ou em tomar alguma atitude
em favor de seus objetivos, por favor, não deixe de fazê-lo. Corra atrás mesmo,
e eu não me coloco fora desta exemplificação. A luta não acabou, por mais que
tenha sido especial algumas situações em que vivi, ainda não é o fim, ainda
temos de subir todos os degraus, vencendo os desafios e contar aos demais que
independente de nossas dores, Deus sempre vai compensando-as e trazendo-nos à
esperança que muitas vezes se perde pelo caminho. Talvez ser piloto pode soar
mais fácil que ser um astronauta, um médico, um cirurgião, mas certamente, as
dificuldades que cada trajetória apresenta foram criadas para vencer somente
aqueles que realmente nasceram com o dom de conquistar cada uma delas. Você vai
se permitir conseguir chegar ao fim e levar à medalha? A resposta está
condicionada a ti mesmo, a mim e a todos nós. Como na vida sempre temos alguém
que admiramos, com minha mãe sempre foi o mesmo, onde ela trabalhou em uma
indústria do segmento farmacêutico, havia uma pessoa muito especial ao qual ela
admirava e tinha como espelho de profissional, a psicóloga de RH Fabiana
Oliveira Guimarães ao qual temos respeito.
6 comentários:
Muito lindo!
Muito Edificante!
Parabéns, Jeisse!
Muito obrigada meu grande amigo. Toda sorte de bênçãos em sua vida 😃 Bons voos...✈️
Amém! Muito obrigado, querida amiga.
Parabéns Jeisse! Muito bom, sábias palavras.
Obrigada Felipe, meu Vice-presidente de confiança. Voe bem por onde for...
Pode usar saias no trabalho de piloto ou copiloto? Ass: Maria Aparecida.obg
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