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5 de dezembro de 2016

QUANDO UM PILOTO PODE DESCUMPRIR AS REGRAS DE TRÁFEGO AÉREO? by Prof. Soares



Durante todo o dia a maioria de nós precisamos tomar importantes decisões, e isso não é diferente no dia a dia de um piloto ou controlador de tráfego aéreo.  Algumas vezes esses profissionais precisam tomar suas decisões em circunstâncias muito complexas, em situações de emergência, sob muito estresse e em ambientes degradados.

Na atividade aérea as aeronaves voam normalmente em grande velocidade, e, caso aconteça algo errado não há tempo para pedir opiniões, consultar os manuais, ou “pedir ajuda aos universitários”. Fazendo uma analogia com um carro, se você tiver um problema mecânico basta parar no acostamento. Acho que todos concordam que em voo a situação é bem mais complicada.

No Código Brasileiro de Aeronáutica no Art. 166 diz que “O comandante é responsável pela operação e segurança da aeronave”. Por essa razão, as autoridades aeronáuticas têm tanta preocupação com a formação e treinamento de pilotos e controladores de tráfego aéreo. Os pilotos precisam estudar regulamentos de tráfego aéreo, navegação aérea, meteorologia aeronáutica, aerodinâmica e motores, além de conhecimentos relacionados operação da aeronave que voa.

Além disso, eles necessitam de constante atualização, fazem cursos de reciclagem e provas de regulamento de tráfego aéreo anualmente. Adicionalmente a todo esse conhecimento deve ser desenvolvido também o conceito e a doutrina de segurança de voo, para que o piloto possa estar comprometido e efetivamente agir e decidir de forma assertiva e segura em suas operações.

Infelizmente alguns profissionais, graças a Deus uma pequena minoria, conhecem o conceito apenas na teoria e não na prática. E o resultado é fácil de imaginar: esses pilotos, se passarem por uma situação de emergência, é muito provável que não saberão tomar a decisão correta, aquela que poderia evitar um acidente e salvar muitas vidas.

Será que é possível identificar estes tais, que são exceções, mesmo antes de provocarem um acidente? Eu acredito que sim. Costumo dizer que eles têm o “perfil do piloto acidentado”. Costumam se se comportar da seguinte forma:

·         São pessoas normalmente arrogantes, têm uma verdade própria;

·         Desprezam as Regras de Tráfego Aéreo dizendo que só servem para atrasar a aviação;

·         Menosprezam as instituições e as autoridades;

·         Consideram-se “Às da aviação” um verdadeiro Top Gun, gostam de viver perigosamente e de contar histórias de como descumpriram as regras e ainda, debocham dizendo que deu tudo certo. Mas um dia, se acontece um acidente, não haverá mais história para contar.



Que bom que esses profissionais, se é que podemos chama-los assim, são realmente uma minoria. A aviação funciona seguramente com regras claras e conhecidas por todos os profissionais, e a cultura de segurança de voo é amplamente difundida e seguida por todos.

Mas eu quero fazer uma pergunta: Um piloto pode descumprir as regras de tráfego aéreo legalmente? A resposta é sim.

A ICA 100-12 Regras do Ar, no item 3.4.1 diz: “O piloto em comando, quer esteja manobrando os comandos ou não, será responsável para que a operação se realize de acordo com as Regras do Ar, podendo delas se desviar somente quando absolutamente necessário ao atendimento de exigências de segurança.”

A única condição para que um piloto possa se desviar ou descumprir as Regras do Ar é exclusivamente em uma situação de emergência onde ocorra risco de vida humana, caso contrário esse piloto incorrerá em infração de tráfego aéreo.

O direito à vida é um direito natural, nasce com o homem, é garantido e protegido pelo ordenamento jurídico brasileiro, portanto quando o piloto tomar qualquer decisão procurando salvar as pessoas, nenhum tribunal humano irá condená-lo.

Um piloto que declare emergência deve deixar claro aos órgãos de tráfego aéreo da real situação que se encontra, conforme a ICA 100-12 Anexo A, item 1.1, onde diz que se o piloto usar a palavra MAYDAY indica que ele está ameaçado de grave e iminente perigo, necessita de assistência imediata e o acidente é inevitável.

Nesta situação o piloto deve prosseguir imediatamente para o pouso, os órgãos de controle irão abrir caminho para aeronave e preparar o aeroporto para receber a emergência.

Mas e se houver outra aeronave que declarou emergência primeira? Como resolver essa situação? O piloto deve esperar até que a outra aeronave tenha pousado?

Neste caso, o órgão de Controle de Tráfego Aéreo deve informar a posição exata da outra aeronave em emergência, como por exemplo, posição no procedimento, distância em relação pista, etc. Para que o piloto da segunda aeronave possa tomar a decisão mais acertada possível.

É importante destacar que a decisão de continuar aproximando para o pouso ou iniciar uma aproximação de emergência é do comandante da aeronave que está em emergência numa situação em que o acidente é inevitável. Logicamente ele deve informar se possível, todas suas ações para que o órgão de controle proporcione a melhor assistência.

Você pode estar pensado, mas se essa aeronave vir a conflitar ou até colidir com a primeira que declarou emergência a catástrofe não pode ser ainda maior? É lógico que essa situação é muito rara, mas acontecimentos recentes mostram que é perfeitamente possível.

Vamos então imaginar essa possibilidade, suponha que as aeronaves se aproximaram muito na reta final, ou ainda pior, a primeira aeronave sofra um acidente ao tocar a pista. É lógico que o órgão de controle deveria de imediatamente comunicar o fato ao comandante da segunda aeronave, então evidentemente não seria possível o pouso naquela pista.

Coloque-se nesta situação, o que você faria? Provavelmente você jogaria a aeronave onde fosse possível, na lateral da pista ou numa pista de taxi. Veja que a preocupação agora seria causar o menor dano a aeronave para que maior número de pessoas pudessem se salvar. Eu sei, é terrível pensar assim, mas na aviação temos que estar preparados, mesmo para situações tão extremas como essa.

Imagine agora a outra situação, para que fique claro o que disse: Digamos que um piloto declare emergência, por exemplo, fogo no motor, e os órgãos de tráfego aéreo informem que o pouso não pode ser autorizado, visto que naquele momento devido um problema qualquer estavam sem bombeiros, mas você está em emergência e precisa pousar agora. O que você faria? Acredito que você decidiria prosseguir assim mesmo para o aeroporto, independentemente de ter bombeiro ou não. E nesse caso, você não estaria contrariando as instruções do controle? Sim estaria.

Por isso, está previsto que o piloto pode contrariar as Regras do Ar, quando absolutamente necessário para segurança, ou seja, para salvar vidas humanas especialmente.

Costumo dizer aos meus alunos quando temos uma emergência grave, isso precisa ficar absolutamente claro aos órgãos de controle, para que eles possam prestar todo apoio possível.

Qual então é a função dos órgãos de Controle de Tráfego Aéreo, nestes momentos? Abrir caminho, preparar o aeroporto para a emergência, e jamais impedir a aproximação da aeronave se o piloto decidiu fazê-lo.
Lembre-se: Em última análise a decisão final é do piloto que está em emergência.

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